entri / dentes
queimando em Mar de Fogo me Registro
lá no fundo do teu íntimo
bem no branco do meu nervo
brota uma onda de sal e líquido
procurando a porta do teu cais
teu nome já estava cravado nos meus dentes
desde quando Sísifo olhava no espelho
primeiro como Mar de Fogo
registro vivo das primeiras Eras
logo depois
gravidez e parto
permitindo o
logos
quando o amor
quisera
Lys aos 18 anos
hoje frente ao espelho
vi o meu amor
aos 18 anos
não sei se estou sonhando
não sei se acordado estou
mas sei que o espelho me trouxe
direto de salvador
pelas mãos de algum santo
pela espada de Ogum
pelas estrela de Oxalá
pela pedra de Xangô
e o espelho agora reflete
toda luz que meu olhar encontrou
diante do Espelho fico zen
chamo zeca baleiro de meu bem
canto a mama canto o papa
canto o negão do rappa
canto até quem não conheço
e não preciso de endereço
pra mandar cartão postal
canto a mina da esquina
que se chama Lys Cabral
Federika Lispector
https://fulinaimacarnavalhagumes.blogspot.com/
jura secreta 55
1
Xangô é parte da pedra
Exu fagulha de ferro
Ogum espada de aço
faz do meu colo teus braços
Oxossi é carne da mata
Yansã é fogo vento tempestade
Yemanjá água do mar
Oxum é água doce
Oxalá em ti me trouxe
te canto como se fosse u
m novo deus em liberdade
2
sou teu leão de fogo
todo jogo que me propor eu topo
beber teu copo comer da tua comida
encarar de frente a janela de entrada
e se for preciso a porta de saída
Artur Gomes
osso. a ponte
quebrada não me leva para o outro lado. olho o espelho d´água e tenho certeza que vou me afogar. engoli o
vento da primeira madrugada a casa era caco de vidros. minha filha vaza os pés
em rio das ostras. nunca mais pensei o mangue como a morada dos peixes e o canal
passava atrás da varanda da cozinha. hoje estou sóbrio muito mais que
embriagado pela maresia com esse cheiro de sexo evaporando pelos olhos e o corpo
tremendo de susto por não ter com quem gozar.
Espelho 1
não te quero apenas nas entre linhas
te quero também nas entre minhas
lá onde o amor lateja
quero que lá esteja
como uma estrela nua
desafiando a lua
nos lençóis de linho do mar
Espelho 2
te procuro
desde os meus primeiros passos
desde os meus primeiros dias
quando te encontro em meus braços
faço de ti: poesia
Espelho 3
fotografei o espelho
em tua íris retina
e revelei a menina
que em meus olhos havia
banhada de sal e sol
em pétalas de girassol
que os meus olhos comiam
Espelho 4
diante desta metáfora
o espelho é só um truque
na trama do teatro que vivi
algumas imagens
permanecem na medula da memória e me mantém vivo. ontem mesmo te vi à beira mar
e mesmo não estando foi como se estivesse tatuada em minha pele com letras de
sol e sal nos raios de luz do luar beijei teu nome nas algas e mergulhei no teu
olhar.
Pontal de Atafona
jura secreta 115
este teu olho que me olha
azul safira
ou mesmo verde esmeralda fosse
pedra – pétala rara
carne da matéria doce
ou mesmo apenas fosse
esse teu olho que me molha
quando me entregas do mar
toda alga que me trouxe
jura secreta 116
nossas palavras escorrem
pelo escorrer dos anos
estradas virtuais
fossem algaravias
nosso desejo que não se concreta
e
eu tenho a fome entre os dedos
a sede entre os dentes
e a língua sobre a escrita
que ainda não fizemos
e o que brota desse amor latente
se o desejo
é tua boca
no lençol dos dias?
jura secreta 126
as orquídeas ainda são azuis
girassóis relâmpagos na chuva
na surpresa dentro a tempestade
dessa manhã que finda
pimenta tua boca em chamas
incendeia meus lençóis profana
essa linguagem como arco-íris
como fosse pulsação que arde
nas entranhas dessa luz de fogo
nos meus dentes mastigando a tarde
jura secreta 128
a carne que me cobre é fraca
a língua que me fala é faca
o olho que me olha vaca
alfa me querendo beta
juro que não sou poeta
a ninfa que me ímã quando arquiteta
o salto da abelha quando mel em flor
e pulsa pulsa pulsa pulsa pulsa
na matéria negra cor
quando a pele que veste é nada
éter pluma seda pelo
quando custa estar em arcozelo
desatar a lã dos fios do novelo
no sol de Amsterdã desvendar Hollandas
e os mistérios da palavra por entre os cotovelos
jura secreta 129
a coisa que me habita é pólvora
dinamite em ponto de explosão
o país em que habito é nunca
me verás rendido a normas
ou leis que me impeçam a fala
a rua onde trafego é amplo
atalho pra o submundo
o poço onde mergulho é fundo
vai da pele que me cobre a carne
ao nervo mais íntimo do osso
jura secreta 135
essa esfinge me devora
fosse Afrodite ou fosse Vênus
fenícia Fênix ou fosse Flora
muito seria de menos
o poema/nuvem em tua boca
como uma Ítaca de Creta
na mitologia sagrada
alguma jura secreta
na carne da Fênix de Fogo
o mar entre as coxas de Hera
o sol nos olhos de Íris
metáfora na ira de um deus
por quê me acordas Electra
se no sonho ainda sou Zeus?
terra,
antes que alguém morra
escrevo prevendo a morte
arriscando a vida
antes que seja tarde
e que a língua da minha boca
não cubra mais tua ferida.
amada de muitos sonhos
e pouco sexo
deposito a minha boca no teu cio
e uma semente fértil
nos teus seios como um rio
domingo
mar de barco
mar de pele
mar de peixes
mar de algas
como um poema de Olga
onda de sal nas minhas mágoas
como sua pele de mel
com sua pele de água
Terra
e vamos nós
cada vez mais ácido de vento
cada vez mais óxido de mar
ave de rapina e sua presa
envenenada indefesa
sem ter como me salvar
jura secreta 45
de Dante a Chico Buarque
todos os poetas
já cantaram suas musas
Beatriz são muitas
Beatriz são quantas
Beatriz são todas
Beatriz são tantas
algumas delas na certa
também já foram cantadas
por este poeta insano e torto
pra lhes trazer o desconforto
do amor quando bandido
Beatriz são nomes
mas este de quem vos falo
não revelo o sobrenome
está no filme sagrado
na pele do acetato
na memória do retrato
Beatriz no último ato
da Divina Comédia Humana
quando deita em minha cama
e come do fruto proibido
poÉtika
eu sou drummundo
e me confundo
na matéria
amorosa
posso estar
na fina flor da
juventude
ou atitude
de uma rima
primorosa
e até na
pele/pedra
quando me invoco
e me desbundo baratino
e então provoco umbarafundo Cabralino
e meto letra no
meu verso
estando prosa
e vou pro fundo
do mais fundo
o mais profundo
mineral Guimarães Rosa
mar de búzios
vaza sob meus pés um Rio das Ostras
as minhas mãos em conchas
passeiam o mangue dos teus seios
e provocam o fluxo do teu sangue
os caranguejos olham admirados
a volúpia dos teus cios
quando me entregas o que traz
por entre as praias
e permites desatar
todos os nós do teu umbigo
transbordando mar de búzios
oceanos - atlântico pulsar entre dois corpos
que se descobrem peixes -
e mergulham profundezas
qualquer que seja a hora
em que se beijam num pontal
em comunhão total com a natureza
tem dias que a
gente sente
o coração bater pulsar mais forte
como uma banda de rock
montado em seu cavalo alado
despeja cores
no corpo da mulher amada
com os pincéis
encravados entre as coxas
transformou Hollandas
em quintais de vento
reINventou o tempo
na hora de pintar
jura secreta 138
rasguei as velas
que teci em tempestades
rompi as noites
em alto mar de maresias
pensei teu corpo
pra amenizar tanta saudade
e vi teus olhos em cada vela que tecia
viagem
passear por tuas costas
gravar meu nome em tatuagem
para ficar no teu corpo
numa infinita viagem
me enfiar como queira
por entre a pele e o tecido
pra encontrar minha casa
dentro do teu vestido
me embriagar com teu gozo
me lambuzar com teu riso
quem sabe está em tua boca
a porta do paraíso
come vento
menina
come vento. não há mais metafísica
no mundo do que comer vento
Federico Baudelaire
https://fulinaimagemfreudelerico.blogspot.com/
Folha Corrida
Acabo de ganhar um presente, um tesouro: Folha
Corrida, livro que comemora os 70 anos do grande Poeta Sérgio de Castro Pinto, e os seus 50 anos de Poesia. Autor de Camões/Lampião, Poesia vencedora do II FestCampos de Poesia Falada.
Sérgio de Castro Pinto constrói sua Poesia como quem pinta
um quadro expressionista através das palavras que lapida em cada verso.
o poeta septuagenário
o poeta
arrasta
os pés
e tropeça
nos versos
de pés
quebrados.
o poeta
não mais
se inspira.
o poeta
só inspira
cuidados
Sérgio De Castro Pinto
Folha Corrida - poemas escolhidos de 1967 a 2017-
Escrituras - www.escrituras.com.br
não sou casta
e sei o quanto custa
me jogar as quantas
quando vejo tantas
que não tem coragem
presas pela covardia
eu sou voragem
dentro da noite veloz
na vertigem do dia
Federika
Lispector
https://www.facebook.com/federikalispector/
Em face dos últimos acontecimentos
Oh! sejamos pornográficos
(docemente pornográficos).
Por que seremos mais castos
Que o nosso avô português?
Oh ! sejamos navegantes,
bandeirantes e guerreiros,
sejamos tudo que quiserem,
sobretudo pornográficos.
A tarde pode ser triste
e as mulheres podem doer
como dói um soco no olho
(pornográficos, pornográficos).
Teus amigos estão sorrindo
de tua última resolução.
Pensavam que o suicídio
Fosse a última resolução.
Não compreendem, coitados
que o melhor é ser pornográfico.
Propõe isso a teu vizinho,
ao condutor do teu bonde,
a todas as criaturas
que são inúteis e existem,
propõe ao homem de óculos
e à mulher da trouxa de roupa.
Dize a todos: Meus irmãos,
não quereis ser pornográficos?
Carlos Drummond de Andrade
Poema Obsceno
Façam a festa
cantem e dancem
que eu faço o poema duro
o poema-murro
sujo
como a miséria brasileira
Não se detenham:
façam a festa
Bethânia Martinho
Clementina
Estação Primeira de Mangueira Salgueiro
gente de Vila Isabel e Madureira
todos
façam
a nossa festa
enquanto eu soco este pilão
este surdo
poema
que não toca no rádio
que o povo não cantará
(mas que nasce dele)
Não se prestará a análises estruturalistas
Não entrará nas antologias oficiais
Obsceno
como o salário de um trabalhador aposentado
o poema
terá o destino dos que habitam o lado escuro do
país
– e espreitam.
Ferreira Gullar
a navalha na
carne
pode cortar
pode doer pode sangrar
e ferir fundo
prefiro a do do prazer
que o riso
sub imundo
Federika Lispector
https://www.facebook.com/federikalispector/
governantes de negócios
Aves de rapina
sobrevoam os céus
de Brazilírica
vender é grande jogo
dos governantes de negócio
não é metáfora metafísica
figura de linguagem
e pura sacanagem
eles dão o golpe
na calada da noite
no romper da madrugada
vendem a coisa pública
porque gostam da privada
Cristina Bezerra
https://www.facebook.com/sagaraninha/
o instante em tua coisa já
esta noite
vou roubar tua boca
e falar por entre
teus dentes e língua
me apossar do teu silêncio
da tua alma
do teu corpo
antes do amanhecer
já te terei em mim
em cada músculo
ainda vivo
em cada poro
entre teus pelos
minha língua
os meus dentes
minhas unhas
nada ficará em teu corpo
que não seja eu
em cada coisa que o instante é
eu quero estar em tua coisa já
Federika
Lispetor
https://www.facebook.com/federikalispector/
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