terça-feira, 5 de março de 2024

múltiplas poéticas



qualquer noite dessas quero estar em Santa Teresa olhando a lua nova até que se transforme em lua cheia volta e meia dá saudade de um janeiro de dois mil e dez que dá até coceira na sola dos pés vontade de caminhar pelas ruelas rever os trilhos as trilhas tantas por onde um dia revivi teu coração azul passeia por aqui como passarinho mexe com o meu em desalinho e vai pousar em outro ninho teu coração azul é bandeirinha  de volpi enfeitando o meu presente atemporal

cacomanga

 

na roça desde cedo comecei a escavar palavras e separar uma das outras de acordo com o seu significado dar farelo de milho para os porcos e olhadura de cana para o gado aprendi que no terreiro não dependo de mercado e para que urbanidade se a cidade não tem paz com a enxada capinei a liberdade e descobri que ditadura        é uma palavra que não cabe nunca mais

 Artur Gomes

https://fulinaimargem.blogspot.com/

 

CONTRABELLUM PERENNIS

Olá, ditadores de todo o mundo,
desuní-vos! Servi-vos à vontade
mas não despejeis sobre nós!

Augusto de Campos.

 

REITERAÇÕES SOBRE UM TEMA

o vento no canavial
as bandeirinhas de Volpi
os leões que Hokusai desenhou todos os dias
por 219 dias até morrer

a forma não se atinge nunca
na reiteração das coisas no tempo
as coisas – elas mesmas
são outras e tu
outro és

e o café as camisas brancas o assoalho da casa,
o qual pisaste e tornarás a pisar,
numa configuração nunca idêntica,
porque a madeira desbota e teus cabelos vão a cinza

viver – eis a fissura
é estar inacabado até o fim 

 

                    Laís Araruna de Aquino

 

MUDEZ


A voz se cala
diante do muro
: intransponíveis palavras
rastejando inutilmente
na garganta gasta.

[não há linguagem que supere
o esplendor daquela que canta
ao abrir e fechar de algumas asas]

Nic Cardeal
02.03.2024

 

Sarau Campos VeraCidade
Dia 15 de Março 19h –

Abertura – leitura do poema Cidade de Prata Tavares – por Artur Gomes

Participações:
mesa de bete-papo:
Sylvia Paes + Fernando Rossi + Carol Poesia + Ronaldo Junior

poesia:
Clara Abreu + Jonas Menezes + Valdiney Mendes + Marcelo Perez + Maria Carla

música:
Thais Fajardo + Arnaldo Zeus + Reubes Pess

teatro infantil:

Grupo GOTA
Reciclar Pode Ser Uma Festa
direção:
Simone Jardim

contação de estória
: Onalita Tavares Benvindo

produção:
Artur Gomes e Clara Abreu
direção: Artur Gomes
local: Palácio da Cultura – Campos dos Goytacazes-RJ
Realização: Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima - Prefeitura de Campos

Campos Veracidade

https://fulinaimacarnavalhagumes.blogspot.com/

Realização: Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima – Prefeitura de Campos Uma Nova História

 

NÃO HÁ PAREDES
MIGRANDO NA TUA AUSÊNCIA


Quando arranquei
teus olhos da parede
perdi as unhas.

Perdi o olfato
arranhando memórias
do teu cheiro.

Perdi a pele dos dedos
e senti os ossos raspando
janelas insensatas.

Já havia perdido a razão
exata de todas as certezas.

Era dor, mas
também libertação.

O cerco do teu olhar
vigiava a minha sede.

Dedos sem carne
alguma. Coração
fugindo pela boca.

Coloquei teus olhos
sobre a mesa e decidi
guardá-los na distância.

Não furei as pálpebras
nem salguei a íris.

Deixei as lágrimas
secando na sombra
solene dos dias...

Mirei de frente aquele
imenso desapego.

Fiquei só.

Sem unhas, sem a pele
descarnada dos dedos.

Falanges esquecidas

sem o sangue apodrecido
da despedida...

Lau Siqueira 

— em João Pessoa, Paraíba.

 

CÂNTICO PARA ENLOUQUECER CRISTO

 1 poema Deleuze

 

Corpos sem órgãos, corpos órfãos, rostos - ganhos? com orifícios, organismos.

Integrados - imigrantes, corpos nômades, corpos padres, sem prédios,

 eus esquizoides[w1] , maquinário inédito soltando gases, metais pesados,

corpos passarelas-viadutos, linhas de fuga.

 2

Sibilina bailarina Lacan[w2] 

 

A sílaba sibilou lá

perto da preposição de cá

sibilina, bailarina, Lacan 

lamparina consoantes, luzes caatingas 

onde não há mais fonte, onde não mais grito

questões de regência, restingas,

bonde das palavras ônibus de interjeições, gritando

a este estado de clamor - pronomes normativos

a manifestação dos pontos com barricadas e travessões

a fraseologia clama ideias

todas juntas formam clamores

perante uma oração que ainda existe, Deus ?

gentios, pagãos, slogans

as palavras estão com seus sinais trocados? 

aqui não precisamos de heróis, ainda não.

 3

Casa Vazia

 

um monge nervoso

porque esqueceu

a chave de casa

catalogou algumas

palavras em ordem

de preferência 1 aflito 2 conflito 3 reflito 4 ação refletida

Casa vazia - olhar a casa como se não estivesse dentro

o monge depois da aflição

se viu numa zona de conflagração

meditou, meditou, meditou

e viu que a casa é vazia,

pois ele não tinha casa,

morava num mosteiro.

 

Fernando Andrade

 

Purpurina

“Eu vou te jogar num pano de guardar confetes”.

                                                          Zé Ramalho

 

Os dias passam e ainda

esses pequenos pontos brilhantes, esses

que insistem em esconder-se

 nas dobras dos joelhos

 sobre o silêncio das espáduas

 no pescoço e em pontos remotos

das curvas do meu corpo.

Tomo outro banho

 

Que se esvaiam as lembranças

que eu não quero mais você

há tantos carnavais

esses pontos luminosos

 estrelinhas que insistem em me lembrar

das coisas sem nome certo ou endereço

 A memória, valsa cheia de tropeços

 

Tentativas, ato falho

 promessas ao avesso,  juras ao vento

 e ilusão passageira persistem

 como tatuagens secretas no corpo

Terei te esquecido

quando eu finalmente lavar

o carnaval do meu rosto...?

 

Marcela Giannini

A MULHER QUE MATOU OS PEIXES

nada sabia das ilhas japonesas,
de suas cachoeiras, rios e cascatas;
nunca reparou na beleza ondulante
dos pequenos dragões vermelhos
brancos, amarelos, prateados
nem viu as “imagens do mundo flutuante”
pintadas em gravuras de madeira coloridas
nem as pipas em formato de peixe
hasteadas por meninos em dias festivos;
a mulher que matou os peixes
nada sabia sobre as antigas histórias
que as avós japonesas contavam aos netos:
que as carpas nadavam contra a correnteza
saltavam cascatas e até mesmo montanhas
para depositarem os seus ovos
e por isso dizia-se que eram dragões.
Não, a néscia nada sabia dessas histórias
e mesmo que soubesse, não faria diferença:
ela só queria roubar as pequenas moedas
jogadas por turistas no lago do Palácio.

Cláudio Daniel

Arte: Tsukioka Yoshitoshi


Escrever tem sido um esforço.
A vida parece que exige mais do que posso oferecer.

Não há tempo.
Corre, menina, corre!
Tic, tac, tic, tac…
45 anos
Tic, tac, tic, tac…
As contas
Tic tac…
Filhas
Tic tac…
Aula de teatro
Aula de balé
Aula de música
Aula de cerâmica
Não dá tempo!
Corre, menina!
Reunião às 14h
Corre!
Cirurgia marcada!
Exames adicionais:
Ultra
Sangue
Put@
Corre!
Não dá tempo!
Saber das notícias do mundo…
Mãe, estou doente
Remédio$
Faz um purezinho para mim?
Corre!
Coloca o sapato! Olha a hora!
Não cabe, mãe.
Vai de sandália!
Quando sair do trabalho, compro outro
Tic , tac…
Filha, passa no mercado?
Seu pai não está bem.
Não dá tempo!
Leia um livro, para expandir os conhecimentos
Corre!
Você precisa se cuidar, fazer uma atividade física
Quando sair do trabalho
Tic, tac, tic, tac…
Passo no mercado e compro o sapato
Corre!
Mãe! Mãe!
Estou com medo
Não me solta, dorme comigo?
Tic, tac, tic, tac…
Amanhã, depois que sair do trabalho, passo no mercado, compro o sapato, marco o médico
faço os exames, pego na escola, levo ao parquinho, faço purê, compro os remédios, abasteço o carro, troco o óleo…
5 minutos para o beijo de namoro virtual
-te amo!
Enquanto dirijo, entro na reunião,
faço boxe ou musculação e durmo contigo, filha.
Corre, menina! Corre!
Tic, tac, tic, tac…
Escreva, não pare de escrever!
Você precisa goz@r. Tesaum, sabe?
Não dá tempo!
Durmo?

Flávia Gomes



                                    *


*

agora

agora, quero ficar sozinha

tocar o coração e beijá-lo

quero um escuro para iluminar os olhos

 

vá embora

procure um lugar quieto

 

de longe os pensamentos se falam

não é magia

é física

 

talvez não seja física

nem linguagem

é segredo

 

agora confesso :

vamos juntos se um habita o poema do outro

ou o inferno.

 

Márcia Maranhão de Conti

@marciadeconti



Afetos

Forasteiros
Imagens salvas

choro minguado
doces bolores
de cortinas fechadas

abraços em ombros nus
silêncios assombrados

soluços contidos como
o gotejar de folhas verdes
"belo como todos os registros de lucidez e loucura"

preces de amores amanhecidos
peles retalhadas
olfatos terrestres
risos do céu

canduras de estrumes
rasgos de poetas

suicídio de emoções acopladas
febril cavalgada em crisântemos roxos

soluços derrubados
evocação do sofrimento

convulsão da dor
malfeitores do amor

amputação do ser!

 

Luiza Silva Oliveira 


Juras Secretas 

feitiçarias de Artur Gomes - por Michèle Sato 

Difícil iniciar um prefácio para abordar feitiçarias de um grande mestre. A mágica aparição do texto transborda sentidos cósmicos, como se um feixe de luz penetrasse em um túnel escuro dando-lhe o sorver da vida. Diariamente, recebo um deserto imenso de poemas e a leitura se esvai com “batatinha quando nasce põe a mão no coração”. Um ou outro me chama a atenção, desde que sou do chamado “mundo das ciências” e leio poemas com coração, mas inevitavelmente aguçado pelo olhar crítico vindo do cérebro. 

A academia pode ser engessada, mas é, sobremaneira, exigente. Aplaude o inédito, reconhecendo que o poema é um caos antes de ser exteriorizado, mas harmônico, quando enfeitiçado. A leitura requer algo como canto do vento, que não seja fugaz, mas que acaricie no assopro da Terra. Por isso, é com satisfação que inicio este pequeno texto, sem nenhuma pretensão de esgotar o talento do grande mestre, mas responder aos poemas de Artur que brilham, soltam faíscas, incendeiam-se em erotismo e garras enigmáticas. Ele transcende regras, inventa palavras, enlouquece verbos. E as relações estabelecidas revelam a desordem dos sonhos na concretude harmônica de suas palavras. 

A aventura erótica não se despede de seu olhar político. Situado fenomenologicamente no mundo, e transverso nele, Artur profana o sagrado com suas invenções transgressoras. Reinventa a magia e decreta uma nova vida para que o mundo não seja habitado somente pelos imbecis. Dança no universo, com a palavra fluída, imprevistos pitorescos, mordidas e grunhidos. Reaparece no meio de um cacto espinhoso, mas é absurdamente capaz de ofertar a beleza da flor. Contemporâneo e primitivo se aliam, vencem os abismos como se ao comerem as palavras monótonas, pudessem renascer por meio da antropofagia infinita de barulhos e silêncios. O sangue coagulado jorra, as cavernas se dissolvem e é provável que poucos compreendam a beleza que daí se origina. 

Nos labirintos de suas palavras, resplandece o guerreiro devorador, embriagado, quase descendo ao seu próprio inferno. Emana seu fogo, na ardência de sexo e simultaneamente na carícia do amor. Pedras frias se aquecem, coram com o tom devasso que colore a mais bela das pornofonias. Marquês de Sade sente inveja por não ser o único déspota das palavras sensuais. E os poemas de Artur reflorescem, exalam odor como desejos secretos e risos que ecoam no infinito. 

não fosse essa alga queimando em tua coxa ou se fosse e já soubesse mar o nome do teu macho o amor em ti consumiria (jura secreta 5) 

De repente um cavalo selvagem cavalga na relva úmida, como se o orvalho da manhã pudesse revelar o fogo roubado das pinturas rupestres. Ao som de tambores, suas palavras se tornam arte em si, como se fossem desenhos projetados em um fantástico mundo vertiginoso. Seres encantados surgem das águas originários de sentimento, abraçadas nas pedras lisas, rugosas, esverdeadas da terra. O fogo dança em vulcões e a metamorfose é percebida em seus ares. Os elementos se definem como bestas, humanos, ou segmentos da natureza como uma orquestra sinfônica que vai além da sonoridade. Adentram sentidos polissêmicos e, neste momento, até o André Breton percebe o significado das palavras de Artur, pois a beleza é convulsiva e crava no peito feito cicatriz. 

e o que não soubesse do que foi escrito está cravado em nós como cicatriz no corte (jura secreta 10) 

Da violação do limite, do fruto proibido ou da linguagem erótica, os poemas de Artur são orgasmos literários que oscilam entre o sacro e o profano. Sua cultura, visão de mundo e inteligência possibilitam ir além da pura emoção sentimental, evocando a liberdade para que a terra asfixiada grite pela esperança. Artur comunga com outros seres a solidariedade da Terra, ainda que por vezes, seja devastador em denunciar disparidades, mas é habilidoso em anunciar acalentos. A palavra poética desfruta fronteiras, e Roland Barthes diria que a história de Artur é o seu tributo apaixonado que ele presta ao mundo para com ele se conciliar. Em sua linguagem explosiva, provavelmente está a intensidade de sua paixão - um amor perverso o suficiente para viciar em suas palavras, mas delicado o bastante para dar gênese ao mundo enfeitiçado pela habilidade de sua linguagem. 

A essência deste perfume parece estar refletida num espelho, pois se as linguagens podem incluir também o silêncio, as palavras de Artur soam como uma melodia. Projetada numa tela, a pintura erótica torna-se sublime e para além de escrevê-las, ele vive suas linguagens. Esta talvez seja a diferença de Artur com tantos outros poetas: a sua capacidade de transcender a tradição medíocre para viver um intenso de mistério de sua poética. Ele não duvida de suas palavras, nem as censura para não quebrar seu encanto, mas devora em seu ser na imaginação e no poder de sua criação. Criador e criatura se misturam, zombam da vida, gargalham da obviedade. Põem-se em movimento na dança estrelas que iluminam a palavra. 

Os fragmentos poéticos são misteriosos de propósito, uma cortina mal fechada assinala que o palco pode ser visto, porém não em sua totalidade. Disso resulta a sedução para que ele continue escrevendo, numa manifestação enigmática do poder surrealista em nos alertar sobre nossas incompletudes fenomenológicas. O imperfeito é o sentido da fascinação, diria Barthes em seus fragmentos de um discurso amoroso. E a poética de Artur não representa ressurreição, nem logro, senão nossos desejos. O prazer do texto pode revelar o prazer do autor, mas não necessariamente do leitor. Mas Artur lança-se nesta dialética do desejo, permitindo um jogo sensual que o espaço seja dado e que a oportunidade do prazer seja saciada como se fosse um "kama sutra poético" para além do prazer corporal. Esta duplicidade semiológica pode ser compreendida como subversiva da gramática engessada - o que, em realidade, torna seus textos mais brilhantes. Não pela destruição da erudição, mas pela abertura da fenda, para que a fruição da linguagem seja bandeira cultural da liberdade. 

E a sua liberdade projeta-se num horizonte onde a dimensão sócio-ambiental é freqüentemente presente. É uma poesia universal de representações urbanas e rurais, de flora, fauna e fontes de praças públicas. Desacralizando o “normal previsível”, borda em sua costura de mosaicos, esquinas e passaredos. 

A poética das Juras Secretas opõem-se a instância pretérita numa espiral de presente com futuro. Metafisicamente, desliga-se do momento agonizante e os olhos do poeta não se cansam, ainda que a paisagem queira cansá-los. Seu toque lembra o neoconcretismo, por vezes, cuja aparição na semana da arte moderna mexeu com os mais tradicionais versos da literatura ordinária. Mas sua temporalidade vence Chronos, na denúncia de um calendário tirano ao anúncio de Kairós, também senhor do tempo, mas que media pelos ritmos do coração. 

20 horas 20 noites 20 anos 20 dias até quando esperaria... até quando alguém percebesse que mesmo matando o amor o amor não morreria. (jura secreta 51) 


É óbvio que a materialidade da linguagem, sua prosódia e seu léxico se mantêm no texto. Mas foge das estruturas engessadas do arrombo repetitivo, florescendo em neologismos verossímeis e ritmos cardíacos. Amiúde, são palavras jorradas em potente cultura significante. No chão dialogante, este poeta desestabiliza a normalidade com suas criações. 

por que te amo e amor não tem pele nome ou sobrenome não adianta chamar que ele não vem quando se quer porque tem seus próprios códigos e segredos mas não tenha medo pode sangrar pode doer e ferir fundo mas é razão de estar no mundo nem que seja por segundo por um beijo mesmo breve por que te amo no sol no sal no mar na neve. (jura secreta 34) 

ARTUR GOMES é, para mim, um grande relato de seu próprio devir, que sabe poetizar a partir de seu vivido. E por isso, enfeitiça. 

 

Michèle Sato – Bióloga, pesquisadora na Universidade Federal do Mato Grosso do Sul. 


Jura Secreta 

não fosse essa jura secreta 
mesmo se fosse e eu não falasse 
com esse punhal de prata 
o sal sob o teu vestido 
o sangue no fluxo sagrado 
sem nenhum segredo 

esse relógio apontado pra lua 
não fosse essa jura secreta 
mesmo se fosse eu não dissesse 
essa ostra no mar das tuas pernas 
como um conto do Marquês de Sade 
no silêncio logo depois do susto
 

 

 Jura secreta 1 


a língua escava entre os dentes 
a palavra nova 
fulinaimânica/sagarínica 
algumas vezes muito prosa 
outras vezes muito cínica 

tudo o que quero conhecer: 
a pele do teu nome 
a segunda pele o sobrenome 
no que posso no que quero 

a pele em flor a flor da pele 
a palavra dandi em corpo nua 
a língua em fogo a língua crua 
a língua nova a língua lua 

fulinaímica/sagaranagem 
palavra texto palavra imagem 
quando no céu da tua boca 
a língua viva se transmuta na viagem 

  

Jura secreta 2 

não fosse esse punhal de prata 
mesmo se fosse e eu não quisesse 
o sangue sob o teu vestido 
o sal no fluxo sagrado 
sem qualquer segredo 

esse rio das ostras 
entre tuas pernas 
o beijo no instante trágico 
a língua sem que ninguém soubesse 
no silêncio como susto mágico 
e esse relógio sádico 
como um Marquês de Sade 
quando é primavera 

 

                                             Jura secreta 3 


fosse essa jura sagrada 
como uma boda de sangue 
às 5 horas da tarde 
a cara triste da morte 
faca de dois gumes 
naquela nova granada 
e Federico Garcia Lorca 
naquela noite de Espanha 
não escrevesse mais nada 

 

Jura secreta 4 

a menina dos meus olhos 
com os nervos à flor da pele 
brinca de bem-me-quer 
ela inda pensa que é menina 
mas já é quase uma mulher 

  


não fosse essa alga 
queimando em tua coxa 
ou se fosse e já soubesse 
mar o nome do teu macho 
o amor em ti consumiria 

Olga Savary 
no sumidouro dos meus dias 

o couro cru 
na antropofágica erótica 
carne viva 
tua paixão em mim 
voraz língua nativa 

 

Jura secreta 6 

o que passou não ficará já foi 
a menina dos meus olhos 
roubou a tua menina 
e levou para festa do boi 

fosse um Salgado Maranhão 
nosso batismo de fogo 
25 de março 
e o morro querosene  em chamas 
no canto pro tempo nascer 

e o amor que a gente faria 
o sol acabou de fazer 

 

 Jura secreta 7 


fosse Sampa uma cidade 
ou se não fosse não importa 

essa cidade me transporta 
me transborda me alucina 

me invade inter/fere na retina 
com sua cruel beleza 

como Oswald de Andrade 
e sua realidade 

como Mário de Andrade 
e sua delicadeza 

 

 

Jura Secreta 8

artefato (poema sujo)

 

numa cidade abstrata

sem sentido ou significado

matadouro é arte concreta

veracidade é pecado

pago com pena de morte

 

esta máquina de escrever

fotografada em Itaguara

como um poema de Lorca

escrito em Nova Granada

cravado em Araraquara

 

você não sabe onde está

você não sabe onde  é

você não sabe de quem foi

este punhal na metáfora

que sangra a carne do boi

  

Jura secreta 9 

não fosse o teu amor 
o meu conforto 
e eu teu anjo torto 
meu amor como seria 

se a jura secreta 
não fosse mais que um poema 
e se eu não te amasse 
como Glauber no cinema 

o que tenho aqui 
no corpo em transe

:

a quem daria? 

 

                        Jura secreta 10 

fosse o que eu quisesse 
apenas um beijo roubado em tua boca 
dentro do poema nada cabe 
nem o que sei nem o que não se sabe 

e o que não soubesse 
do que foi escrito 
está cravado em nós 
como cicatriz no corte 
entre uma palavra e outra 
do que não dissesse 


O COISA RUIM

me querem manso
cordeiro
imaculado
sangrado
no festim dos canibais

me querem escravo
ordeiro
serviçal
salário apertado no bolso
cego mudo e boçal

me querem rato
acuado
rabo entre as pernas
medroso
um verme, pegajoso

mas eu sou osso
duro de roer
caroço
faca no pescoço
maremoto, tufão, furacão

mas eu sou cão
lato
mordo
arreganho os dentes
incito a revolta dos deuses
toco fogo na cidade

qual nero
devasto o lero lero
entro em campo
desempato
eu sou o que sangra
um poeta nato

Ademir Assunção
do livro Zona Branca (2001) 

 

AGOSTO À CONTRAGOSTO

 

O tempo nos tece uma veste

E muito custa esse imposto

Pois lento nos dá outro susto

Gastou-se mais um agosto

 

Posto que vasto é o tempo

E visto que nos é imposto

Viver só um tempo sucinto

Numa sina à contragosto

 

E a soma insana dos anos

Aos poucos sela um desgosto

No raso espaço do espelho

O tempo esculpe seu rosto

 

Tchello d`Barros



*

o negro do céu

abrilhanta a lua
ai, que frio!

em meus sonhos
o telefone toca
acordo.

a lua no céu
estrelas cintilam
oh, insônia

a lua sumiu
o céu escureceu
nada aconteceu

Cesar Augusto de Carvalho
do livro Curto Circuito
Editora Patuá - 2019
www.editorapatua.com.br



cheguei ao céu

diz o pinheiro

eu sempre quis

mas

o meu lugar

é a raíz

 

Hamilton Faria

Poemas da janela

 


 
poesia fulinaimargem

             arte revolução

não gosto de panelinha

mas adoro um caldeirão

 

Federico Baudelaire

www.fulinaimargem.blogspot.com


não conheço

mas é como

se conhecesse

 

disse-me ontem

a psicóloga

 

antes que

amanhecesse

 

depois de uma noite

de trégua

depois de passar a régua

 

na direção dos caminhos

 

Rúbia Querubim

https://porradalirica.blogspot.com/


arquitetura/poesia

 

enquanto arquitetos

                  desenhistas

desenhavam

eu foto.grafava escrevia poesia

 

muitas vezes a arquitetura do poema

me vem em linhas fulinaímicas

                                         sinuosas

se em verso

      ou prosa

  não explico

 

o que me importa

é o ofício

ao qual eu me dedico

 

Artur Gomes

para o livro Vampiro Goytacá

Canibal Tupiniquim

leia  mais  no blog

https://fulinaimargem.blogspot.com/

 

tupi or not tupi

Itapetininga pedra de sal no mar de Pirapitanga tem gente que de repente deixou de ser ou já não era¿ quem disse que amor é santo¿ nem tudo que poderia te dizer escrevo nem sei mais quem habita as costas do teu litoral e quantas algas já contei nas asas do temporal imagens em chamas vieram nas entre linhas rasgando as entre minhas esporas palavras dela quem disse que desejo não cabe no poema?

meu objeto do desejo tem nos olhos cor de algas e algum peixe que se foi sem teatro a alma não respira perde-se a vida Serafim Ponte Grande ainda me aponta uma ponte algumas trilhas tenho uma amiga que ainda não sabe quanto é musa — nas Juras Secretas para ela muito já foi escrito e muito mais ainda tenho a escrever até rasgar as entranhas nas armadilhas do ser estou desde dezembro sem poder fazer o que gosto e isso me deixa em desgosto a vida sem tira-gosto vida de gado:

 

Artur Fulinaíma

O Homem Com A Flor Na Boca

https://fulinaimatupiniquim.blogspot.com/

disponível para compra aqui

https://www.editorapenalux.com.br/autor/MzAz/Artur_Gomes


somos todos pornográficos

 

teu corpo

é carne de manga

em meu pênis viril

enquanto sangra

quando beijo tu boca

enfurecido

rasgando por trás

o teu vestido 


EuGênio Mallarmè 

https://personasarturianas.blogspot.com/


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