Mata
em nós
Por
nós
Mesma
espécie
Em
cada um que morre
Morremos
todos
Mesma
carne
Somos
quem mata e quem morre
O ato
vil de um único homem
Nos
envilece a todos
Quem
mata faz da humanidade uma espécie assassina
Quem
morre, nos faz vítimas
Os
imorais nos igualam
Os
íntegros nos diferenciam
Balança
desequilibrada
Tudo o
que é humano está latente
Nada
nos escapa
Podemos
tudo
E,
talvez por isso,
Perdemos
tudo
Armando Liguori Junior
Eu, Armando Liguori Junior, 59 anos,
paulistano, ator e jornalista por formação, humano de nascença. Poderia ser
médico, arquiteto, astronauta, oceanógrafo, carcereiro, estilista, personagem
num parque da Disney, limpador de lutador de sumô, influenciador,
meteorologista, filósofo, mergulhador. Poderia ser um viajante rodando o mundo
quantas vezes fosse possível numa vida. Poderia ser qualquer coisa, qualquer
um, sou humano: se outros podem, também posso.
Mas escolhi escrever para estranhos.
Atrás da porta
"Quando olhaste bem nos olhos meus
E o teu olhar era de adeus
Juro que não acreditei
Eu te estranhei, me debrucei
Sobre o teu corpo e duvidei
E me arrastei e te arranhei
E me agarrei nos teus cabelos
No teu peito, teu pijama
Nos teus pés, ao pé da cama
Sem carinho, sem coberta
No tapete atrás da porta
Reclamei baixinho
Dei pra maldizer o nosso lar
Pra sujar teu nome, te humilhar
E me vingar a qualquer preço
Te adorando pelo avesso
Pra mostrar que ainda sou tua
Até provar que ainda sou tua"
Francisco Buarque de Hollanda
gosto
de percorrer
territórios
de palavras
às
vezes as escrevo
de
forma simples
noutras
rebuscada
amarro
o céu
na
ponta da lua
para
sacolejar estrelas
no
café da manhã
pão
com manteiga
o
beijo do sereno
tenho
pelas palavras
tremendo
respeito
não as
desajeito
em
ideias mirabolantes
esses
dias
vi uma
delas
na
carona de
um
basculante
confesso
fiquei atordoado
com
tamanha ousadia
pensei
se caísse
o que
aconteceria
palavras
tem dessas coisas
se
desprendem
da
razão
se
contentam
em
provocar emoção
também
penso sobre isso
da
necessidade do poema
se o
tudo já escrito
já não
valeu a pena
de
drummond a pessoa
de
quintana a leminski
dos
novos e velhos poetas
que
ainda insistem
vou
parando por aqui
pra
não enrolar mais a conversa
daqui
a pouco vão dizer
que
sou mais um
metido
a poeta
Dinovaldo Gillioli
OBLIVION
Esqueci os sons das palavras,
como consultar dicionários,
os nomes das borboletas.
Hoje vigoram ruídos,
os mergulhos dos afogados,
a estridência dos espectros.
Será preciso reconstituir
a ingenuidade da ortografia,
os resquícios dos pergaminhos,
a criação do alfabeto.
Só então poderei nomear
as flores fecundadas no silêncio.
Cleber Pacheco
"Eu me
esqueci no armário.
Pensei estar vivendo,
estudando, trabalhando, sendo!
Pensei ter amado e odiado,
aprendido e ensinado,
fugido e lutado,
confundido e explicado.
Mas hoje, surpreso,
me vi no armário embutido
calado, sozinho, perdido, parado."
Mário Quintana
Sem pouso
Como pássaros que voltam para um último olhar
Como anjos que voam pro infinito
Como folhas verdes que tremem na pulsação da terra
como o gotejar irregular da água caída das folhas
depois que a tempestade se acalma
Mártir da minha própria agonia
Sempre em sussurros de coceiras e sedes
E o amor, esse soluço líquido da vida
Volto para o útero da emboscada da vida
Vadia, em seus prazeres libidinosos tão-somente
Rogo aos ventos do outono
Uma vida áspera e viçosa
De caminhos nunca antes trilhados
Há um cansaço de inteligência abstrata em poder
respirar a alma...
São tantas as incertezas...
'O mundo é para quem nasce para o conquistar. E
não para quem sonha que pode conquisTá-lo, ainda que tenha razão'.
LUIZA SILVA OLIVEIRA
(Abaixo minha pintura , em horas de lazer kk)
Degenerados
(Clique sobre as imagens para ver melhor)
Valdir
Rocha
Seu nome eu não
sei qual é,
pseudônimo ou terra natal;
sua arte, em meu simples chalé,
o torna um ser imortal.
Claudia Lundgren
CORPOS D’ÁGUA (Poesia, 2023)
Paulo Ramos
Mulê da Gota
Tentam esgotar o meu corpo
Tentam secar o meu corpo
Tentam definhar o meu corpo
Orquestradamente se escondem
Debaixo de minha saia
De gota, em gota
Que se enche o rio
De gota, em gota
Que se enche o balde
De gota, em gota
Que se enche o pote
De gota, em gota
Que se enche o copo
De gota, em gota
Se enche um corpo
De desgostos, esgoto
Esvazia o corpo
Seca, definha, esgota corpo
Corpo menstruação
Corpo amamentação
Corpo parto
Corpo lágrima
De gota, em gota sangue
De gota, em gota leite
De gota, em gota bolsa
De gota, em gota prantos
De gota, em gota dor
Meu corpo é como mandacaru
Quanto mais escasso
O Estado deixa
Mais água meu corpo destila
O Estado não sai debaixo de minha
saia
É por medo de ser levado por um mar
de gente
Ninguém percebe minhas inquietações
Logo, não me incomodo
Porque escondo as minhas dores
Debaixo da saia.
-
Paulo Ramos teceu com cuidado e beleza deste
livro de poesia. Corpos d’Água é um presente - um vislumbre profundamente
reflexivo e reflexivo da política de raça, gênero, sexualidade, ancestralidade,
terra e tempo nas nossas vidas nas Américas. Cada palavra ecoa no espaço-tempo
de nossa experiência negra. [...] Beba cada palavra e saboreie a vida. Obrigada
Paulo, pela tua beleza, pela tua visão. Obrigado por nos ver, mulheres negras,
e escrever nossas vidas na página. Axé. –
CHRISTEN A. SMITH, escritora e professora
Departamento de Estudos da África e da Diáspora Africana Universidade de
Austin, Texas.
A água e suas propriedades
intrínsecas são mais que um motivo poético, mas um padrão estrutural para a
reconexão de si com um fluxo perdido. Interrompido. Represado. Corrompido.
“Corpo menstruação/Corpo amamentação/Corpo parto/ Corpo lágrima”, canta Ramos
novamente. Materialidade fluida, como a poética e a própria negritude [...]
Paulo Ramos, menino preto feiticeiro, faz do corpo água para enxaguar toda a
dor de nossa História. –
OSMUNDO PINHO, escritor e professor Programa de
Pós-Graduação em Estudos Étnicos e Africanos Universidade Federal do Recôncavo
da Bahia.
Este livro não é de poesia,
puramente. Por favor, não o coloque nesta seção, na sua prateleira, nas
bibliotecas. Não o faça assim. Seria minimizar a importância e o peso histórico
que possui cada letra, palavra, frase e sentidos no fazer memória.
- DINA ALVES Doutora e Mestra em Ciências Sociais
PUC/SP Atriz e advogada
PAULO RAMOS, natural do útero de Terê,
ator/poeta e jurista. Doutorando e mestre do Programa de PósGraduação em
Ciências Sociais Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Membro dos
grupos de pesquisa: Observatório do Racismo e INANNA - Núcleo de Pesquisa sobre
Sexualidade, Feminismo, Gênero e Diferenças PUC/SP. Idealizador do selo
Pretaquisador.
Capa Brochura - formato 14x21 cm -
páginas 92
Claudinei Vieira – Desconcertos Editora
Para Ti
Foi para ti
que desfolhei a chuva
para ti soltei o perfume da terra
toquei no nada
e para ti foi tudo
Para ti criei todas as palavras
e todas me faltaram
no minuto em que talhei
o sabor do sempre
Para ti dei voz
às minhas mãos
abri os gomos do tempo
assaltei o mundo
e pensei que tudo estava em nós
nesse doce engano
de tudo sermos donos
sem nada termos
simplesmente porque era de noite
e não dormíamos
eu descia em teu peito
para me procurar
e antes que a escuridão
nos cingisse a cintura
ficávamos nos olhos
vivendo de um só
amando de uma só vida
Mia Couto
In "Raiz de Orvalho e Outros Poemas"
Pode ser que eu vá na tua boca
comer teu pão e entregar teu olho
matar o sono que nunca encontrei
ver tua alma e não saber de ti."
Romério Rômulo
poesia
I
chegas a
mim
como uma
égua assanhada
não quer
saber do meu carinho
só quer
saber de ser trepada
II
eu te
penetro
em nome do
pai
do filho
do espírito
santo
amém
não te
prometo
em nome de
ninguém
terra
amada de
muitos sonhos
e pouco
sexo
deposito a
minha boca
nu teu cio
e uma
semente fértil
nos teus seios como um rio
Artur Gomes
Suor &
Cio – MVPB Edições – 1985
leia mais
no blog
https://arturgumes.blogspot.com/
metáfora
meta dentro
meta fora
que a meta desse trem agora
é seta nesse tempo duro
meta palavra reta
para abrir qualquer trincheira
na carne seca do futuro
meta dentro dessa meta
a chama da lamparina
com facho de fogo na retina
pra clarear o fosso escuro
Artur Gomes
O Homem Com A Flor Na Boca
https://fulinaimatupiniquim.blogspot.com/
escrevo sobre a mulher que sou com letra cursiva
fujo dos nomes, das origens e da palavra que oprime
sem álibi ou embaraço
meus passos são largos
sempre apressados
equilibro-me num tango adulterado e dramático
às margens do abismo
minha mãe não contou sobre as ruínas do mundo
nada falou e calada apenas me olhou
naquele instante, tremi com o corpo úmido
sob um céu sem estrelas
e desde então, aprendi a inventar
pequenas alegrias
nas balbúrdias do dia a dia
Benette
Bacellar - 2024
Imagem via Pinterest
BOLAÑOLATRIA
Me lembro do primeiro livro de Roberto Bolaño que
caiu sob as minhas vistas.
Foi o "Noturno do Chile". Espiei lá
dentro. O título e a linguagem me chamaram de imediato a atenção.
Notei que o autor havia morrido cedo, aos exatos
50 anos de idade. Pensei: parece ser um escritor latino-americanos adepto de
experiências vanguardistas. Desses que aprontam um bocado e se despedem cedo do
mundo.
Não comprei o livro. Só o leria bem mais tarde,
depois de descobrir Bolaño de fato. E o meu primeiro passo efetivo rumo ao seu
universo literário veio com o romance "Os detetives selvagens". Era o
início de minha bolañolatria.
Quase toda a obra do chileno já foi lançada no
Brasil. Do que restava publicar, chega agora um de seus livros badalados,
"O gaúcho insofrível".
Mais uma vez é hora de celebrar o maior expoente
literário de sua geração, responsável por promover um novo boom cujo epicentro
se localizou na América Latina, como antes, com seus predecessores do realismo
mágico.
Não faltou a Bolaño o reconhecimento da força
daqueles que vieram antes dele, pavimentando-lhe o caminho.
Vejamos o que ele declarou a respeito daquele boom
inaugural e seus principais protagonistas, na última entrevista que concedeu,
reunida no livro "Roberto Bolaño - the last interview and other
conversations":
"A literatura de Vargas Llosa ou de García
Márquez é gigantesca. O trabalho de Vargas Llosa, por exemplo, é imenso. Ele tem
milhares de pontos de entrada e milhares de pontos de saída. Assim é a
literatura de García Márquez. Ambos são figuras públicas. Não são apenas
figuras literárias. Vargas Llosa foi candidato a presidente. García Márquez é
um peso-pesado político e muito influente na América Latina. Eles são
superiores, superior às pessoas que vieram depois e, com certeza, aos
escritores de minha geração. Livros como 'Ninguém escreve ao coronel' são
simplesmente perfeitos."
Roberto Bolaño não viveu o suficiente nem para ver
o estrago que a adesão ao neoliberalismo provocou em certas reputações, nem
para colher os louros do seu sucesso estrondoso. Talvez não hesitasse em também
se admirar com o mérito do seu próprio boom.
Paulo Lima
cinquentenário
vivo comigo
há 50 anos
não me entendo
como não entendo
a minha poesia
talvez viver
seja isso
essa quase urgência
em nunca saber
viver é moderno
envelhecer é eterno
Do livro ‘ parangolares, pg. 26, do
poeta
Aroldo Pereira.
Aroldo Pereira
Poeta-Performer-Ator, ‘tá na pista’, já por 1/2 século com sua poesia
sarcástica, marginal, ácida, sentimental, por esse Brasil a fora — vivendo,
rebolando-se em ‘parangolés’, resistindo (sem correr com os versos debaixo dos
braços / quando a barra pesa), vendendo seus filhos-filhas poéticas, ”só assim
ele pode voltar e pegar um Sol em Copacabana”!
João Bosco Gomes
A SINTONIA DO POEMA
O poema é elemento vivo que se
estende
sobre a mesa feito um pão ou vero
vinho,
é algo que perdura em oferenda,
hálito de sal, sopro de búzio e
trompa,
toda uma sinfonia que sozinha soa
enquanto o maestro lhe solfeja o sol
da existência que lhe insufla uma
alegria,
ser conforme o tempo em plena
sintonia.
José Eduardo Degrazia
corpos à deriva
reativos
da ponta do indicador ao outro
... parecemos pinturas valiosas
expostas em molduras,
proibidos ao toque
corre um rio
um rio largo escorre
de uma boca a outra
mas se a conversa é séria
inter/dito
cada um na sua margem de contenção
quando o silêncio é o que impera
em um olhar que nos mira fundo
escapole diante às abordagens
do que há dentro da pele,
não penetra
a verdade
não remove as linhas do remendo
que nos ata o tear da vida
e nos faz incomunicáveis
- banais para o amor
impenetraveis ao coração
o desnudar
dos aflitos que somos
nos condenam às gazes do entorno
do peito
tirar dói, manter dói
fingir nos arrebenta
que queres aqui dentro
se não te pertenço, não te faço
parte?
quem é você no mundo que te tem?
quem te habita o lado de dentro?
quem sustenta teu olhar em riste...
- sem, amolecer?
és tu,
ali naquela galeria de belas artes...
aqui em mim?
nessa boca que não alcanço
o fluir que leva adentro...
que muro é esse entre nós e o outro?
que é tão vapor
que quase sentimos o cheiro da pele?
acho que se fôssemos uma tela exposta
estaríamos tão frescos
que escorreríamos além da moldura,
da parede até o chão
e evaporaríamos para além do teto
estais à deriva dos desejos?
estou?
Rosa
Rosangela Ataide
"Agora já não há espera
quando não estás, não sou.
E quando chegas,
o tempo não sabe mais de mim.
Eis-me prisioneiro
do instante infinito.
Posso sangrar
na lâmina da despedida.
Mas nunca mais
tenho partida."
.
Mia Couto
A pesquisa acadêmica por vezes
parece ser solitária. Há aquela imagem batida de um escritor/pesquisador
sentado na escrivaninha, anotando coisas num caderninho, digitando rapidamente
no computador, com óculos de tartaruga.
Uma coisa que aprendi ao longo dos 4 anos de
doutorado é que, além de uma pesquisa focar em fenômenos coletivos, todo seu
caminho de construção também pode ser feito com muitas mãos.
Daí que Cecília Castro, Ana Elisa Ribeiro e Samara
Coutinho organizaram "Mulheres que editam", com a contribuição de
outras mulheres pesquisadoras, a fim de incluírem diversos verbetes com o nome
e a história de mulheres que editaram e editam livros no Brasil. Claro que
estamos falando de um recorte, mas é fundamental que façamos esse rastreio na
linha cronológica brasileira.
Tive o prazer de participar como pesquisadora,
enviando 4 verbetes de editoras mulheres. Também fui entrevistada pela Samara
Coutinho e incluída como um verbete, contando rapidamente sobre minha
experiência enquanto editora da Macabéa Edições.
Uma grande conquista para as futuras e futuros
pesquisadores de nosso país nas áreas de edição, literatura e história!
Priscila Branco
curuminha
para Rúbia Querubim
tua pele clara de pêssego
ou mesmo de manga fosse
lembra-me
frutas tropicais
com sal e mel agridoce
intenso sabor tupiniquim
clarice beatriz que fosse
ou mesmo esse anjo serAfim
que dorme em praias distantes
e acorda dentro de mim
Artur Gomes
https://porradalirica.blogspot.com/
Todo Dia É Dia D Poesia Todo Dia
pela lei dos meus enganos
eu sou drummundo
fulinaímico leviano
Zeus amante de Afrodite
mesmo que seja Vênus
e ninguém mais acredite
SagaraNAgens Fulinaímicas
guima meu mestre guima
em mil perdões eu vos peço
por esta obra encarnada
na carne cabra da peste
da hygia ferreira bem casta
aqui nas bandas do leste
a fome de carne é madrasta
ave palavra profana
cabala que vos fazia
veredas em mais sagaranas
a morte em vidas severinas
tal qual antropofagia
teu grande serTão vou cumer
nem joão cabral severino
nem virgulino de matraca
nem meu padrinho de pia
me ensinou usar faca
ou da palavra o fazer
a ferramenta que afino
roubei do meste drummundo
que o diabo giramundo
é o narciso do meu Ser
Artur Kabrunco
Sagaranagens Fulinaímicas
Juras Secretas
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